História e Cultura 27 de março de 2025

Cordelista e pesquisador afirma que o cangaço começou com Lucas da Feira

Na opinião de Jurivaldo Alves, cordelista que estuda o cangaço, esse movimento de razão social surgiu em Feira de Santana 

Oitenta e nove anos separam Lucas da Feira de Virgolino ‘Lampião’, o que significa que não houve contemporaneidade entre os dois. Cada um tinha sua forma de lutar, sua estratégia, sua área geográfica, trajes e armamentos diferentes, mas ambos tinham em comum o desejo de reparar as injustiças sofridas e vingá-las. Na opinião de Jurivaldo Alves, cordelista que estuda o cangaço, esse movimento de razão social surgiu aqui, em Feira de Santana, tendo como precursor Lucas Evangelista.

Embora Virgolino Pereira da Silva – Lampião, considerado ‘o rei do cangaço’, que aterrorizou parte do Nordeste entre 1918 e 1938, nunca tenha pisado as terras de Feira de Santana, muito antes disso o cangaço existiu na Bahia e foi originado aqui, na terra de Senhora Santana. A opinião é do cordelista, folheteiro e estudioso do cangaço, Jurivaldo Alves da Silva. Ele justifica esse ponto de vista indicando Lucas Evangelista dos Santos – Lucas da Feira, como precursor ou um dos precursores desse movimento social de luta contra os poderosos latifundiários ou ‘coronéis’.

Na verdade, conforme Jurivaldo, a partir do final do século XIX, o movimento começou a se esboçar em algumas zonas do Nordeste, onde imperava de forma mais veemente o mando de latifundiários poderosos acobertados por autoridades e políticos insensíveis ao sofrimento popular e apenas preocupados com a obtenção de benesses. Nesse processo, muitos desses ‘coronéis’ constituíam bandos de cangaceiros para defender seus ‘impérios’ da ação de outros poderosos.

Desse modo, o cangaço deixava de ser apenas uma luta do sertanejo explorado e humilhado contra os poderosos, ganhando também essa vertente de uma ‘guerra’ entre grandes mandatários da economia rural. Antes de Lampião, o Nordeste conheceu e temeu Antônio Silvino, João Cacundo (era corcunda), Antônio Vermelho, Quirino, Gato Bravo, Cunduru, Cabeleira e outros de extrema violência que marcaram suas passagens pela maldade praticada indistintamente, até mesmo contra pessoas humildes como eles. Todavia, na Bahia, Lucas Evangelista, entre 1822 e 1849, na opinião de Jurivaldo, foi chefe de um grupo de cangaceiros, embora assim não fosse ainda denominado.

Os cangaceiros de Lampião e outros grupos tinham bom armamento, inclusive muitas armas de fogo, cavalos, roupas adequadas para andar no mato, treinamento e coiteiros, que davam guarida e os apoiavam. Essa é a grande diferença, já que os escravos revoltados, que acompanhavam Lucas da Feira, não dispunham de armas, abrigos e eram caçados como animais, sem qualquer condição de defesa.

O feirense Lucas era o ‘Demônio da Senzala’, assim como o pernambucano Virgolino ganhou o nome de guerra ‘Lampião’. A Lucas atribui-se atitudes de extrema violência e não apenas roubos que, em muitos casos, conforme historiadores, eram destinados a pessoas pobres, que viviam em condições de miséria. O escravo fugitivo teria cometido homicídios, abusos sexuais e outros deslizes inomináveis. O grupo por ele constituído teria de sete a nove membros. Nicolau, Januário e Flaviano foram presos e enforcados; Bernardino e Jabá, irmãos de Lucas, desapareceram, e outros membros tiveram breve passagem e sequer foram identificados.

Desse modo, garante Jurivaldo Alves, há muita semelhança nas trajetórias de Lucas e Lampião, e as diferenças observadas não os diferenciam, até porque ‘o objetivo era comum: a luta contra as injustiças’. Caçado pela polícia, Lampião e parte do seu bando, incluindo a mulher Maria Bonita, caíram em Grota do Angico, no interior de Sergipe, em 28 de junho de 1938, mas morreu lutando, apesar da surpresa do ataque. Lampião tinha então 41 anos de idade.

Já Lucas Evangelista desapareceu de forma menos honrosa para o seu ideário, devido a uma recompensa estipulada de quatro contos de réis, que atraiu seu compadre José Pereira Cazumbá. Este, convocando Manoel Gomes, inimigo de Lucas, e o escravo Cipriano, saiu por trajetos conhecidos para encontrar o procurado sob uma quixabeira no local hoje conhecido como bairro Mochila. Na primeira tentativa, Cazumbá feriu o escravo fugitivo com um tiro em um dos braços. Arregimentando Benedito e escravos do tenente Dionísio de Cerqueira Pinto, Cazumbá continuou sua missão, conseguindo prender Lucas no dia 28 de janeiro de 1848, na Fazenda Tapera, próximo ao Rio Jacuípe.

Inocêncio Marques de Araújo Góes, o Barão de Desterro, presidente do Conselho de Segurança, julgou-o e o condenou à morte. Aos 25 anos de idade, Lucas Evangelista foi enforcado em outubro de 1849, na atual Praça Dom Pedro II, onde depois foi implantado o Abrigo Nordestino e hoje há uma loja de confecções. Entre a morte de Lucas (1849) e a de Lampião (1938), há um espaço de 89 anos. Jurivaldo aponta esse detalhe como prova de que o cangaço, embora em cenário e alguns aspectos diferentes, começou aqui, em Feira de Santana.

Secom/PMFS

Fotos: ACM, Arquivo Agência Senado e Redes Sociais

Feira Hoje, 27/03/25

 

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