“Sou escritor porque escrevo”: uma evidência aristotélica em Cyro de Mattos
Por Taurino Araújo, Ph.D.*
Cyro de Mattos nasceu em Itabuna, cidade do Sul da Bahia. Ficcionista, poeta, cronista, ensaísta, autor de livros para jovens e crianças, organizador de antologia e coletânea. Já publicou 70 livros individuais, e, entre eles,Os brabos, contos, Prêmio Afonso Arinos da Academia Brasileira de Letras, O menino camelô, poesia infantil, Prêmio da Associação Paulista de Críticos de Artes, Os ventos gemedores, romance, Prêmio Pen Clube do Brasil, e Histórias de encanto e espanto, Prêmio Nacional da Cidade de Manaus. Seu Cancioneiro do cacau deu-lhe o Segundo Prêmio Internacional de Literatura Maestrale Marengo d’Oro, Gênova, Itália, para obra estrangeira publicada, o Prêmio Nacional de Poesia Ribeiro Couto da União Brasileira de Escritores (Rio) e o Terceiro Lugar do Prêmio Nacional Emílio Moura da Academia Mineira de Letras. Obteve nove primeiros lugares nos prêmios da União Brasileira de Escritores (Rio). Foi agraciado com Menção Honrosa no Prêmio Jabuti, livro Os recuados, contos, e ficou entre os quatro finalistas do Concurso Internacional de Literatura da Revista Plural, no México, com a noveleta Coronel, cacaueiro e travessia. Finalista do Jabuti por duas vezes e no Prêmio Nacional de Contos do Paraná (FUNDEPAR), sétimo lugar, concorrendo entre mais de 1500 autores. Conquistou o Prêmio Internacional Casa das Américas 2023 (Cuba), com o livro Infância om Bicho e Pesadelo e Outras Histórias.
É membro da Ordem do Mérito da Bahia, Pen Clube do Brasil e Academia de Letras da Bahia onde ocupa a cadeira 22, que tem como fundador Rui Barbosa. Em 2020 foi distinguido com a Medalha Zumbi dos Palmares da Câmara de Vereadores de Salvador. Em 2020 foi agraciado com o Prêmio Conjunto de Obra Eletrogóes/Academia de Letras da Bahia. Em 2023 foi distinguido com a Comenda Dois de Julho da Assembleia Legislativa da Bahia. É o primeiro Doutor Honoris Causa da Universidade Estadual de Santa Cruz. Entre os tradutores de sua obra figuram Curt Meyer-Clason (Alemanha), Marcel Vejmelka, doutor em tradução, Universidade de Main. em Germersheim (Alemanha), Fred Ellison, Professor Emérito da Universidade do Texas, em Austin, USA, Mirella Abriani, poeta, Itália, Pedro Vianna, dramaturgo e poeta, Luiz Angélico, Doutor Professor Emérito da Universidade Federal da Bahia, Alfredo Pérez Alencart, poeta e professor da Universidade de Salamanca, Meritxell Hernando, professora doutora da Universidade Federal de Santa Catarina, e Antonella Rita Roscilli, Itália, doutora em Letras, da Academia de Letras da Bahia.
Introdução
Em tempos de rótulos fáceis e identidades performadas, afirmar “sou escritor porque escrevo” pode parecer uma obviedade. No entanto, essa afirmativa de Cyro de Mattos encerra uma profunda verdade filosófica. Longe de se tratar de uma tautologia, ela revela uma noção aristotélica de identidade vinculada à ação: “justos praticando a justiça, citaristas tocando cítara”. Para Aristóteles, o ser se realiza na prática de sua função própria — sua enteléquia. Logo, o escrever constante e profícuo de Cyro de Mattos é um ato que atualiza a potência de ser escritor. Sem o ato, a identidade permanece latente, incompleta e assim o contrário é um monumento de mais de 70 livros.
I. Ato e Potência: do vir-a-ser ao ser
Aristóteles distingue dois modos do ser: a potência (dynamis) e o ato (energeia). Ser escritor em potência é possuir a capacidade de escrever, ter ideias, domínio da linguagem. Mas é somente ao escrever que essa capacidade se realiza. O ato, portanto, é o que confere realidade plena ao ser. Dizer que se é escritor sem escrever é como dizer que se é nadador sem jamais nadar: uma afirmação sem energeia, sem atualização do ser.
II. A causa final: teleologia da escrita
Todo ser, segundo Aristóteles, possui uma causa final — um propósito que guia sua existência. O propósito do escritor é escrever. Sua excelência (aretê) se manifesta na prática da escrita, no exercício constante do verbo. Assim, escrever não é apenas um meio, mas o próprio fim da condição de escritor. O ser do escritor coincide com o seu agir. O que define o escultor não é o cinzel que carrega, mas as esculturas que produz. Do mesmo modo, o que define Cyro de Mattos são seus textos aclamados no cult e no pop profundo sempre merecedor de adaptações para o teatro, a televisão, o cinema. Uma obra evidentemente tocante.
III. A virtude como hábito: escrevendo-se escritor
Para Aristóteles, a virtude (aretê) se adquire pelo hábito. Ninguém nasce virtuoso, torna-se. E Cyro de Mattos é essa virtude encarnada, desde tenra idade compenetrado com o burilamento da palavra para bem a empregar em textos sempre inesquecíveis. Assim, não se é escritor por nomeação ou título honorífico, mas por uma prática reiterada que molda a alma. A escrita contínua forma o caráter do escritor, integra-o à sua essência, transformando a atividade em identidade. Como a coragem se forja na ação corajosa, o escritor se forja escrevendo. De alguma forma, a escolha e a coragem também fizeram Cyro de Mattos.
Conclusão
Portanto, “sou escritor porque escrevo” é mais que um jogo de palavras. É uma proposição que carrega o peso de uma ontologia ativa, através da qual o ser se afirma no fazer. Aristóteles, se estivesse entre nós, assentiria: escrever é a enteléquia de Cyro de Mattos. Quem escreve, é. Quem não escreve, apenas poderia ser. No mundo real, onde a potência só se afirma pelo ato, a escrita prolífica e relevante de Cyro de Mattos é a condição de existência do escritor.
Escrever é, portanto, existir.
* Taurino Araújo é autor de Hermenêutica da desigualdade: uma introdução às ciências jurídicas e também sociais (Del Rey, 2019), jurista, advogado (UESC) e pensador brasileiro, Taurino Araújo é poeta, crítico literário, Doutor em Ciências Jurídicas e Sociais. A sua Magnum Opus é considerada uma Epistemologia genuinamente brasileira, afora o conceito de verdade absoluta, 95 anos depois da Semana de Arte Moderna (1922). “Celebrando 40 anos de poesia [publicação prevista para 2025], Taurino Araújo apresenta uma obra com paisagens líricas que vão do átomo ao sertão e ao cosmo desafiando os limites da percepção com rigor filosófico e estético dignos de um semiólogo da alma. Maria Solange Alves de Souza Paula – CRB 5/342 Bibliotecária responsável: Dançando no meio do inverno — 40 anos de poesia: poemas, sonetos e haikais”. Especialista em Gestão de Pessoas (PUC-RS), Planejamento Educacional (UNIVERSO-RJ) e História e Antropologia (SERRA GERAL-MG). Autor de Se você quer subir, não aperte descer: a intuição motivacional do verdadeiro Maslow no case Taurino Araújo, Instituto Memória: Curitiba: 2023, 2ª ed., atualizada. Condecorado pelo Estado da Bahia com a Comenda de Cidadão Benemérito da Liberdade e da Justiça Social João Mangabeira – CBJM, a maior honraria do Estado. Em 2025, publicou também Signos em transe: uma Fortuna Crítica sobre a Semiótica de Lícia Soares de Souza. ZL Books: Rio de Janeiro: 2025 — curadoria, organização e apresentação, com outros 61 autores:
- ADRIANO SAMPAIO — p. 450
- A. L. CALMON TEIXEIRA— p. 99
- ALANA FREITAS EL FAHL— p. 459
- BERNADETTE PORTO — p. 329
- BERNARD ANDRÈS — p. 120
- BERTHOLD ZILLY — p. 351
- BERTRAND GERVAIS — p. 379
- BRIGITTE THIÉRION — p. 163
- CACAU NOVAES — p. 245
- CÁSSIO ARAGÃO — p. 438
- CATHERINE MAVRIKAKIS — p. 214
- CLAIRE VARIN — p. 116
- CLAUDIO NOVAES — p. 132
- CYRO DE MATTOS— quarta capa
- DANIEL GUÉNETTE — p. 253
- DANILO HERRERA— p. 456
- DENISE DIAS— p. 321
- ELEONOR CORREIA— p. 345
- ELISABETH AMORIM— p. 393
- EMILIANO JOSÉ— p. 305
- EURÍDICE FIGUEIREDO— p. 144
- FABRICE GALVEZ— p. 109
- FERNAND HARVEY— p. 171
- HUMBERTO DE OLIVEIRA— p. 332
- ISAAC BAZIÈ— p. 218
- JEAN FISETTE— p. 64
- JEAN-FRANÇOIS CÔTÉ— p. 204
- JEAN MORISSET— p. 290
- JEAN-PIERRE PELLETIER— p. 259
- JOSÉ PRUDENCIO SILVA— p. 405
- JUAN IGNACIO AZPEITIA— p. 372
- LEONOR ABREU— p. 146
- LIDIANE PINHEIRO— p. 359
- LOUISE DUPRÉ— p. 249
- LUCILA MOREIRA— p. 237
- LUCIANO TOSTA— p. 299
- LUIZ EUDES— p. 74
- MARIA ANTÔNIA COUTINHO — p. 268
- MARIA DE FÁTIMA BERENICE— p. 277
- MAURIZIO GATTI— p. 135
- MAYSA MIRANDA— p. 314
- NAIARA NEGREIROS— p. 469
- NELSON KILPP— p. 446
- NÚBIA HANCIAU— p. 124
- PATRICK IMBERT— p. 185
- PEDRO BARBOZA— p. 385
- RACHEL BOUVET— p. 367
- RICARDO JUSTO— p. 89
- ROBERTO CHIARICHI— p. 59
- RITA OLIVIERI-GODET— p. 154
- RONALDO AUAD— p. 49
- RUBELISE CUNHA— p. 154
- RUY AGUIAR DIAS— p. 422
- SÉRGIO CERQUEDA— p. 227
- SÉRGIO LEVEMFOUS— p. 222
- SÔNIA MOTA— p. 446
- SUÊNIO DE LUCENA— p. 304
- SYLVANO SANTINI— p. 84
- TAMAR BARBAKADZE— p. 218
- TAURINO ARAÚJO — pp. 3 e 421
- WINFRIED NÖTH— p. 32
- ZILÁ BERND— p. 138
Publicado originalmente em
04/04/25